Vejo um gato à espreita na rua.
Ele me observa a distância por alguns segundos.
Até que salta e senta-se em uma pedra a uns 100 metros
de onde eu estou. Um movimento até mesmo gracioso. Ele então começa a falar
enquanto se lambe.
- Aquela que você procura não está mais nesse lugar.
Depois de alguns segundos observando a cena. Confesso
que achei até bonitinha. Ele havia pousado em um tipo de cordão com um símbolo irreconhecível
no escuro e àquela distância. Abaixo dele um nome e um epitáfio que eu também
não conseguia ler.
O cheiro da morte entrava pelas minhas narinas. Dava
para sentir o vento da noite fria e nublada.
- Esperava vê-la mais uma vez.
- Chegou tarde. Ela já foi levada.
Ele continuava a se lamber em cima da pedra.
- Por que ainda está aqui?
Ele pareceu não ligar para minha pergunta,
simplesmente continuou ali.
Até que de repente uma presença se ergueu na escuridão
as minhas costas. Finalmente o gato se mexeu se ouriçando todo, miou firme como
uma forma de defesa e saiu em disparada. Senti meu corpo congelar e calafrios
subirem por todo ele. Virei-me lentamente na direção da presença.
Um vulto estava em pé a minha frente agora. Ele não possuía
forma. Lembrava chamas negras brotando do chão.
Meu coração disparou com a visão. Meus músculos
enrijeceram. Meu corpo queria sair daquele lugar, mas o pânico havia me paralisado.
Uma voz cavernosa saiu do vulto.
- Queria me ver? Em que posso lhe ser útil?
Eu poderia jurar que vi um sorriso maligno no vulto em
meio a escuridão.
Tentei acalmar meus sentidos que estavam todos
gritando enlouquecidamente. Depois de alguns segundos encontrei um sorriso em
meio a tremedeira do meu corpo. Mais alguns segundos até encontrar a voz.
- Preciso de uma última ajuda sua.
Eu pude sentir o sorriso em meio as chamas negras. E
de repente um rugido soou alto, parecia vir do vulto. Um vento congelante veio
em minha direção e passou por mim. Meus cabelos voaram para trás. Meu corpo
todo se enrijeceu com o frio da noite e então voltou ao normal. Meu rosto
parecia espelhar o sorriso que senti nas chamas. Quando me virei, o gato me
encarava sentado a pedra.
Seu olhar parecia estar irritado e reprovando minha
atitude.
Eu dei as costas e segui meu caminho para fora daquele
lugar.
***
A menina perdida se afastava. Agora distorcida e
manchada. Uma chama negra em sua alma. Na pedra abaixo de mim o rosto de uma
menina contorcido de tristeza e desesperança.
Os humanos se perdem facilmente frente ao poder.
Eu podia ouvir as risadas daquela alma obscura encher
o local, enquanto os ventos rolavam frios pela noite.
*Conto de autoria própria
Referência da imagem:
https://br.freepik.com/fotos-premium/gato-preto-atravessando-um-cemiterio_70908876.htm
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